Ao som de Vento no Litoral, música do longínquo ano de 1991, gravada pelo Legião Urbana, ponho-me mais uma vez a divagar e a relembrar. Sim, porque a vida é, como escreveu Cecília Meireles, formada por "pequenos desejos, vagarosas saudades e silenciosas lembranças"! A letra é triste. Renato Russo mostrou toda a sua melancolia e tristeza pela falta de alguém, ou de algum momento, ou de alguma coisa. É a saudade na sua maior demonstração de dor, porque a saudade dói e dói muito. Uma dor no peito que é difícil explicar. Só quem sentiu ou sente pode dizer. Mesmo sendo triste, é bem melhor caminhar com saudades no coração do que vazio, não é mesmo? Acho que foi o saudoso Peninha que disse isso. Mas a música foi bem proposital, porque o que vou contar tem tudo haver com praia e não achei trilha sonora que mais se encaixasse no que vou descrever.
Era algum mês do inverno de 2004 e estava bem frio. Na época eu vivia em uma república com alguns amigos e reconstruía a minha vida, depois de um desastroso casamento e um turbulento divórcio. Pois é, a vida é um eterno recomeçar! Lecionava em uma faculdade e aqueles dias ou anos foram mágicos. A vida sendo refeita, negócios caminhando de vento em polpa, enfim, a vida pessoal e profissional caminhavam em perfeita harmonia. E nesses dias mágicos eu conheci uma pessoa. Sim, não foi "amor a primeira vista", como costumam dizer nos contos de fadas. Quando a conheci, não despertou sequer nenhum tipo de atrativo. A apresentação foi em um conselho de classe e naquele momento eu nem imaginaria que ali na minha frente estaria a pessoa mais incrível que conheceria nessa existência. Pois bem, como estávamos trabalhando juntos, foi inevitável a aproximação e uma certa confidencialidade entre nós. Eu sempre saia do escritório (eu tinha uma empresa de software) e ia direto para a faculdade. Tinha uma carga horária semanal fechada. Como sempre chegava bem cedo, ficava muitos momentos conversando com ela acerca de trabalho, das casualidades da vida, encontros e desencontros. E naturalmente um vínculo e um "link" começou a ser criado. Em algum momentos saímos juntos, diversos professores, alunos. Íamos para bares, restaurantes, lanchonetes, enfim, todos amigos curtindo happy hour após as aulas. Até que um dia, após uma noite regada a muita cerveja, whisky e amarula - nota: até hoje não posso nem olhar para amarula 🤢🤮 - precisei de uma carona para casa - fiquei ruim, ruim, ruim - e peguei carona com a pessoa e a minha reação ao adentrar ao seu carro foi simplesmente "roubar" um grande e babado beijo. E beijos roubados são os melhores, né? Pois é, tivemos nosso primeiro momento íntimo ali. Eu e ela completamente bêbados dentro do carro. Naquela madrugada - o dia já estava nascendo - eu terminei em casa vomitando até a alma. Sabe, aqueles porres que a gente começa a manhã até bem e vai piorando ao longo do dia? Pois é, achei que ia melhorar próximo do almoço e nada, fui piorando. Achei que não chegaria até o final do dia!
Bom, o que seguiu foi que começamos um grande flerte, nada sério ainda, mas o bastante para deixar aquela empolgação inicial. Sabe aquela música Nortuno, de Raimundo Fagner? Tem um trecho que diz " ... E aquela luz que havia, em cada ponto de partida ... ", pois é, a luz 💡estava mais acesa e brilhante do que tudo. Lembro que os dias que passavam a gente ia se aproximando cada vez mais, de uma forma bem sutil. A tarde, no nada, eu ligava (ainda nem existia whatsapp) e ficávamos sussurrando palavras soltas um para o outro. Às vezes eu mandava entregar morangos com Nutella para ela, pois ela me confidenciou uma vez que adorava. Fora as conversas "noturnicas" que tínhamos usando as salas de bate papo do UOL!
Mas então, era uma sexta-feira e saímos mais uma vez, junto com mais dois amigos. Fomos para um barzinho da moda e bebemos alguns drinks, conversas rolando e deixamos o bar por volta das 22h30. Enquanto eu dirigia para deixá-la em casa, ela me confessou que "adorava o mar e que fazia tempo que não via um nascer do sol assim, em uma praia"! Eu mais que prontamente repliquei:
- Ué ... Porque não vamos?
- Agora?- perguntou ela assustada.
- Sim. Vamos agora. Pegamos algumas bebidas, vamos pra praia ver o sol nascer.
Bem, passamos na sua casa, ela vestiu um biquini e eu passei na república, troquei de roupas e, a bordo de Branca de Neve (um corsinha hatch que tinha) partimos para Guriri Internacional! 😊
Chegamos em Guriri por volta de 1h30. Lembra que era inverno? Pois é, Guriri parecia aquelas cidades fantasmas do interior dos EUA. Só faltava aquele tufo de capim rolando com o vento. Não tinha absolutamente nada, nadica de nada aberto. Nem um bar, nem uma simples loja de conveniência, nada. Disse: "Vamos voltar para São Mateus, na rodoviária deve ter um bar e então a gente compra algumas bebidas e voltamos!" e assim partimos. No caminho, percebemos um velho trailer na beira da estrada. Como diz a gíria popular, era um trailer "copo sujo", bem ao estilo de butecos de periferia. Resolvemos parar ali mesmo para tomar uma cerveja. Além do dono, havia um casal ao fundo e mais uns dois bêbados tomando cachaça. Sentamos ali e pedimos uma cerveja - nem lembro qual foi a marca que bebemos. Deve ter sido alguma antiga, que não fabrica mais hoje (Malte 90, estou lembrando de você!! 🤮 ) No trailer, havia uma tv Telefunken ligado a um DVD passando de Amado Bastisa a Agnaldo Raiol. Aquelas coletâneas que são vendidas por camelôs e vendedores ambulantes. Pois bem, lembrei que eu tinha um DVD do Júlio Nascimento no porta luvas do meu carro. Não me pergunte o porque? É uma longa história e em outro post eu conto. Mas o fato é que eu tinha. Peguei o DVD e coloquei para tocar. Rapaz, o resultado foi que virei o rei do lugar! Foi uma alegria só. Chegou mais gente, o dono começou a colocar mais cerveja na nossa mesa e até rolou uns "pé de galinha" meio que 0800 pra nossa mesa! 😆
Bem, ficamos ali no trailer até por volta das 5h30 da manhã. O dono virou nosso amigo e fez a gente prometer que voltaria em outros momentos. Pegamos umas bebidas e fomos para a praia. Um frio fila da mãe que só não era maior por causa do nosso avançado estado etílico. Ficamos ali na areia da praia, sentados, bebericando um drink, um ao lado do outro e assistimos o maior espetáculo da Terra. O sol nasceu magistral e brilhantemente e nós ali, apenas assistindo e mais nada. Era nós e o sol 🌞. Foi uma noite absolutamente incrível. Não teve rock, não teve sexo, não teve nada. Teve a gente e o sol como testemunha.
E hoje, como bons anos se passaram, eu me lembrei disso por causa de um outro texto que li e aquele dia veio a tona, como se tudo tivesse acontecido ontem. Resolvi registrar para que eu lembre de vez em quando ou até você, se cair por aqui sem querer! 😜
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