segunda-feira, 5 de setembro de 2011

É Tempo De.. – Parte VI – Meddle (1971)


“Caminhe, caminhe
Com esperança no seu coração
E você nunca andará sozinho
Você nunca andará sozinho”

Entre as incertezas e a busca por uma nova identidade, o Pink Floyd lança o sexto álbum de sua discografia, “Meddle”, um trabalho transitório que levaria a banda a um caminho mais sólido e coeso, rumo ao estrondoso sucesso que estaria por vir. Gravado entre os meses de junho e agosto de 1971 no famoso estúdio Abbey Road, é um disco totalmente experimental, marcando o evolucionismo do progressivo a um patamar nunca antes visto ou melhor, ouvido. O disco sempre foi muito bem cotado entre os fãs da banda, principalmente pela experimental e bem posicionada “Echoes”, uma obra-prima do rock progressivo, que em seus 23:27 mostra o entrosamento da banda em sua melhor fase, mas que acabou deixando as outras ótimas faixas do disco em sua sombra, de maneira que para muitos, “Meddle” é sinônimo de “Echoes”, o que não é verdade. Segundo David Gilmour, Meddle está entre os seus favoritos e marca também o princípio da caminhada do verdadeiro Pink Floyd. Embora existam no álbum variadas melodias, “Meddle” é considerado um álbum mais coeso do que o seu antecessor Atom Heart Mother. A capa, pra variar um pouco, trazia uma foto diferente e bem psicodélica, pois poucos conseguem visualizar o que de fato significa. É simplesmente "um ouvido embaixo d'água", que foi usado como base para o desenho final, feito por Storm Thorgerson. Só a título de curiosidade e de registro, a palavra “Meddle” significa intrometer-se ou intervir.
As duas primeiras músicas seguem uma à outra através de um efeito sonoro de vento, um estilo que voltaria em álbuns posteriores Dark Side of the Moon, de 1973, e Wish You Were Here, de 1975. A abertura do álbum se dá com “One Of These Days”, calcada na psicodelia e experimentalismo que foram a marca registrada do Pink Floyd na era Barrett. A faixa foi construída em cima da psicodélica linha de baixo criada por Roger Waters, contendo muitas experimentações sonoras à lá “prog” anos 60/70. A música ainda faz alusões à violência em sua letra composta por apenas uma frase: “One of these days, I'm going to cut you into little pieces” (um destes dias eu te corto em pedacinhos). Era a estréia de Nick Mason como "vocalista". Ela foi o único single do disco. Na edição americana o lado B continha "Fearless" e nas edições japonesas e italianas, "Seamus". A música foi resgatada pela banda na turnê do último álbum de estúdio “The Division Bell”, e pode ser conferida uma excelente versão, mesmo sem Waters, no disco P•U•L•S•E. Em seguida, David Gilmour mostra que conquistou seu espaço na banda e assume os vocais na típica floydiana “A Pillow Of Winds”, música lenta que é levada pelo violão, guitarra e a voz suave de Gilmour. Segundo o baterista Nick Mason, traz uma referência ao jogo Mahjong, que tinham se apaixonado durante a excursão promocional de Atom Heart Mother O disco segue com “Fearless”, uma das mais emocionantes faixas do disco, com belo trabalho de Gilmour e emocionante fundo vocal da torcida do Liverpool, entoando o clássico "You'll Never Walk Alone", composta por Rodgers & Hammerstein II. A canção é uma espécie de símbolo da torcida do time inglês e cantada até hoje quando jogam no estádio Anfield. Uma das faixas mais injustiçadas do Pink Floyd vem em seguida: “San Tropez” é diferente de tudo que a banda já gravou. Composta por Waters, aqui ele canta diferente do seu famoso timbre sofrido e sombrio, dando lugar a um tom mais alegre e sereno. A música possui um ritmo dançante, levado pelo violão de Gilmour e por Wright, que mostra que sua praia é mesmo o jazz num inspiradíssimo solo de piano no final. Tudo isso junto a uma levada de bateria bem simples e seca tem como resultado uma música agradável e de fácil digestão. “Seamus” é considerada por muitos a “ovelha negra” do disco. Trata-se de um blues bem simples criado em cima de latidos de um cachorro. O resultado é bem interessante mostrando mais uma das loucuras que a banda fazia e criava em estúdio. O DVD “Live At Pompeii” mostra a banda tocando e o cachorro latindo num microfone ao lado sendo segurado por Wright. Curioso, no mínimo.
O lado B do disco é inteiro ocupado pela supracitada e maravilhosa “Echoes”, a música que toda banda de rock progressivo gostaria de ter composto. Como li certa vez, “Echoes” é uma delícia de sonoridade e magicamente gostosa de se ouvir. Ela tem uma graça majestosa, enchendo cada um dos seus 23 minutos e 27 segundos com um mistério sofisticado que veio para definir tudo sobre o Pink Floyd: ligeiramente obscuro e extremamente espacial. É sem dúvidas a melhor faixa do disco e uma das melhores músicas da banda, que apesar de ser muito longa, podia ser facilmente executada ao vivo (podia e pode – esses tempos atrás assistir a um show de uma banda cover do Floyd de nome Echoes e eles tocaram Echoes, completinha). Uma de suas melhores versões pode e DEVE ser conferida, também, no DVD “Live At Pompeii”, pois retrata toda energia e entrosamento de um time muito bem treinado, com muita qualidade e vontade de jogar. A música foi criada a partir de diferentes sons elaborados por cada integrante da banda, que juntos e encaixados com a belíssima linha melódica criada por Gilmour e Wright a tornam memorável. Ela se inicia com o famoso som criado por Wright no piano, interpretado por uns como sendo um sonar, e por outros, um pingo no oceano. A partir daí a música vai crescendo aos poucos: entra a guitarra com um solo delicado, o baixo, a bateria, os vocais harmonizados pelo guitarrista e pelo tecladista, até que tudo culmina no famoso trecho que remete à trilha sonora do “Fantasma Da Ópera”. Uma mudança de andamento ocorre dando espaço a uma “jam” com influências de “reggae” e “blues” em que o órgão e a guitarra marcam presença. Tudo vai desaparecendo aos poucos e a música adquire uma atmosfera soturna e sombria, que poderia fazer parte da trilha sonora de um filme de terror. Gilmour faz a guitarra falar e gritar, criando uma sonoridade excepcional. Tudo volta quando a banda entra em cena aos poucos novamente até o retorno dos vocais. A música acaba lentamente dando a sensação de perfeição e coesão sonora. Perfeita, em todos os sentidos. Como já foi dito e não custa nada repetir: “Echoes é a música que toda banda de rock progressivo gostaria de ter composto.
Muito mais bem organizado e maduro que seu antecessor, Meddle foi o primeiro passo rumo à sonoridade ímpar que o Pink Floyd criou nos seus grandes álbuns na década de 70.

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