quarta-feira, 17 de agosto de 2011

É Tempo De… – Parte III – More (1969)


 “A borboleta com asas quebradas
está caída ao teu lado
Todos os corvos estão perto
não há onde você possa se esconder ”
Se você não possui o disco Echoes: The Best Of, é provável que você nunca tenha ouvido falar de More! Por quê? Porque nem sequer o próprio Pink Floyd considerava este disco um verdadeiro álbum do Pink Floyd. E você também notará isso ao ouví-lo. De fato, More não se encaixa no caminho musical que o grupo estava trilhando no momento. Menos de 1 ano após a saída de Barrett (dando lugar a David Gilmour) e da estréia do psicodélico clássico Piper At Gates Of Dawn, o novo Pink Floyd estava lutando para encontrar uma nova maneira de seguir em frente. O álbum foi feito sob encomenda, a pedido do diretor francês Barbet Schroeder, para compor a trilha sonora do filme homônimo. Foi o primeiro trabalho de Shroeder como diretor. Pouco é conhecido sobre a gravação do álbum, porém, segundo Roger Waters, a trilha sonora foi um tipo de “favor pessoal”. As canções foram gravadas em apenas uma semana durante o mês de março de 1969, na mesma época em que um outro trablho estava sendo produzido (a banda interrompeu a gravação deste disco por alguns dias para trabalhar no álbum More). O disco revela uma banda mais bucólica, contendo momentos que flertam com o Heavy Metal e com o Blues. Aqui Roger Waters já começa a demonstrar sua capacidade como letrista competente. Vale ressaltar que More foi o primeiro álbum totalmente produzido pelo Pink Floyd.
O filme conta a história de Stefan, uma estudante alemã, que vai para Ibiza e que se envolve com drogas, especialmente a heroína. O filme não faz muito sucesso e, segundo David Gilmour, o diretor Schroeder, que mesmo conhecendo bem a língua inglesa, fez um roteiro sem força, usando gírias fora de contexto e de forma errônea. O filme fez sua estréia no Festival Internacional de Cannes, em 13 de maio de 1969, e a trilha-sonora foi lançada em junho. Não se sabe o motivo, mas duas músicas que aparecem no filme e composta e pela banda não constam no disco: "Seabird" e "Hollywood".
O LP trazia as seguintes faixas:
Lado A
1. "Cirrus Minor" (Roger Waters) – 5:18
2. "The Nile Song" (Waters) – 3:26
3. "Crying Song" (Waters) – 3:33
4. "Up the Khyber" (Nick Mason, Richard Wright) – 2:12
5. "Green Is the Colour" (Waters) – 2:58
6. "Cymbaline" (Waters) – 4:50
7. "Party Sequence" (Gilmour, Mason, Waters, Wright) – 1:07
Lado B
1. "Main Theme" (Gilmour, Mason, Waters, Wright) – 5:28
2. "Ibiza Bar" (Gilmour, Mason, Waters, Wright) – 3:19
3. "More Blues" (Gilmour, Mason, Waters, Wright) – 2:12
4. "Quicksilver" (Gilmour, Mason, Waters, Wright) – 7:13
5. "A Spanish Piece" (Gilmour) – 1:05
6. "Dramatic Theme" (Gilmour, Mason, Waters, Wright) – 2:15
Cirrus Minor é uma música com um clima onírico. Inicia-se com cantos de pássaros que se prolongam durante o primeiro minuto. Os primeiros acordes de violão começam a ecoar e a voz agradável de David Gilmour emite os primeiros versos. No último verso a voz parece se distanciar para dar lugar ao órgão de Richard Wright que constrói um ambiente celestial. Os pássaros voltam a cantar no final.
The Nile Song é a canção que fala sobre o dia em que Stefan conheceu Estelle. É uma composição bem pesada e com uma sonoridade um pouco suja. A voz de David Gilmour está irreconhecível.
Crying Song nos passa uma sensação de angústia, principalmente o triste solo de guitarra no final. É uma canção essencialmente acústica, acompanhada por teclado e contra-baixo.
Up The Khyber é basicamente um solo de bateria de Nick Mason com algumas passagens de teclado de Rick Wright. Essa música foi criada para compor uma cena de sexo anal que foi cortada do filme. “Khyber” é uma gíria usada no subúrbio londrino e significa traseiro.
Curiosidade: “Khyber” também é uma passagem que liga o Afeganistão ao Paquistão. Nota-se que o Afeganistão é o maior produtor de ópio do mundo (matéria-prima da heroína) e o filme conta a história de viciados em heroína.
Green Is The Colour é uma belíssima música acústica, contando com a participação da mulher de Nick Manson na época, Lindy Mason, nas passagens de flauta. Com quase três minutos de duração, é considerada uma das melhores música do disco. A voz de David Gilmour é um dos destaques, assim como o piano de Wright ao final.
Outro grande destaque do disco é Cymbaline, cantada por David Gilmour. No filme essa canção é cantada por Roger Waters e o verso “Will the tightrope reach the end? Will the final couplet rhyme?” (coincidentemente ou propositalmente o último verso não rima) é substituído por “Standing by with a book in his hand/It’s an easy word to rhyme”. A atmosfera criada pela música é depressiva, como já era de se esperar em um filme com um tema pesado.
Party Sequence é uma música percussiva pontuada em alguns trechos por flauta. Nada de atrativo.
Main Theme é baseada praticamente nos teclados de Rick Wright. Em alguns momentos uma guitarra com slide se incorpora à música. Somando tudo às batidas simples de Mason, tem-se uma canção agradável e com um clima oriental.
Ibiza Bar é uma espécie de irmã gêmea bivitelina da canção The Nile Song, porém contém uma sonoridade menos suja que esta.
More Blues, como o próprio nome demonstra, é um blues sem grandes atrativos. Mesmo assim é outra música agradável.
Quicksilver é praticamente composta por teclados e cria um ambiente fúnebre, de suspense.
A Spanish Piece é uma canção curta, tocada à moda espanhola (música flamenca). Há algumas frases inaudíveis. Na versão para o filme, um bandolim é tocado em A Spanish Piece (a única vez que a banda utilizou o instrumento).
E finalmente Dramatic Theme encerra o álbum. Contra-baixo em destaque, com solos de guitarra e os pratos da bateria pontuando toda a canção.
Há uma música que foi deixada de fora do disco: Seabirds. Não se sabe por que ela foi omitida do álbum, pois trata-se de uma canção com uma bela melodia.
More marca o início da procura da banda por uma identidade própria e o início do domínio criativo de Roger Waters. O Pink Floyd ainda gravaria mais duas trilhas sonoras: algumas músicas para o filme Zabriskie Point de Michelangelo Antonioni e a trilha do filme La Valeé do próprio Barbet Schroeder intitulada Obscured By Clouds.
Pesquisando sobre o álbum, achei um depoimento de um fã que ouviu esse disco meio que doidão (acho eu), a perceber pelas viagens de interpretação de cada música. Não pude deixar de publicar aqui em Noites! :)
Recomendo colocar o cd e ouvir a música enquanto lê e imagina as palavras de cada definição...
1 - Cirrus Minor
Passarinhos voam pelos nossos cérebros conduzindo para mais uma viajem psicodélica quando começam as vozes acompanhadas dos teclados celestiais de Ricky Wright. Olho a volta e vejo alguma coisa estranha, muito diferente do convencional, a princípio o eco mixado dessa voz atrai meu corpo para baixo como se fossem trombetas que anunciavam a chegada de algum novo som não identificado.
2 - The Nile Song
Ah acordei repentinamente com uma explosão sonora que emana-se do horizonte marinho. Ondas realmente altas quebram quando rebatem nas paredes e nos tímpanos. A voz agora apresenta-se gritada e sofrida, um pouco diferente do convencional dessa voz que eu já ouvi em outros lugares e ocasiões. Os ritmos são constantes e barulhentos, harmonizam-se perfeitamente com a música, sempre criando diferentes ruídos com as mesmas sensações.
3 - Crying song
Sinto meu corpo relaxar novamente, ouço vozes suaves em meus ouvidos que dizem sorrir. A percussão antes barulhenta torna-se também suave harmonizando a música.
4 - Up the Khyber
Tudo está girando e eu ouço aquela mesma percussão agora bastante solada, lembrando um bom e velho blues. Sons misteriosos percorrem o estéreo dando uma sensação de movimento, eles vem pausadamente e inconstantemente, seguidos de outros sons estranhos que vem e vão de pouco em pouco. As vozes se calam...
5 - Green is the colour
Sumiu o barulho e eu apenas relaxo com um som repetitivo e um canto capela que acompanha, belos traços distribuídos em um curto tempo.
6 - Cymbaline
O barco balança para os dois lados e o profeta anuncia suas palavras de cima da proa. Todos ouvem atenciosamente enquanto apenas um promove-se um pequeno som também com seu tom calmo e ditador... Logo a emoção toma conta de nosso narrador que é acompanhado pelos outros sons...
7 - Party Sequence
O narrador silencia suas palavras e seu acompanhador instrumental começa a narrar a batalha que deve continuar enquanto todos dançam incessantemente ao redor daqueles que perdem seu sangue.
8 - Main theme
Então um de seus competidores encerra sua fase terrena. A alma sobe com uma batida de percussão que preenche a todo o ambiente dando uma leve sensação de liberdade. No fundo passam desapercebidos alguns flaches diferentes que se repetem, logo, ouço alguns pequenos movimentos de cordas que vem e vão junto com a música.
9 - Ibiza Bar
Estranho, acho que já estive por aqui antes, mas algo mudou... A voz já não diz as mesmas palavras e a intensidade de sensações não é tão forte. Esse lugar é quase igual àquele onde fui derrubado pelas ondas que me levavam rapidamente e furiosamente para um lugar indefinido. Bom ainda assim continua mantendo uma certa originalidade e nem tudo é igual, mas preciso sair daqui...
10 - More Blues
Cansei, e assim segue o ambiente desgastado enquanto os músicos do bar aquecem a apresentação... É diferente afinal só ouço as mesmas cordas e leve percussão de antes.
11 - Quicksilver
Comandante, abram as portas da nave, precisamos partir... Só um minuto estou arrumando algumas coisas e talvez leve tempo, pronto...
Após dois minutos...
Senhor, vejo algumas coisas estranhas lá fora, vamos mais devagar afinal parecem se mover e produzir um som estranho, como teclados amplificados...
12 - A spanish peice
Ha, me sinto um pouco agitado, preciso tomar um trago e aspirar a alguma coisa... Estranho esse lugar me lembra a Espanha e algumas pessoas dançando aquela estranha dança.
13 - Dramatic Theme
Não tenho mais tempo, quem sabe eu possa correr nesses corredores. A percussão de antes agora acompanha meus passos e olhares e eu sinto que outros sons me perseguem como cordas no fundo do corredor, seguindo meus passos de longe, só observando... Sinto que talvez ela possa me pegar, mas não tão cedo...
Pronto agora ela já não me encontra mais e o silêncio vai chegando sucedido de ecos da corda despedaçada.

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